No país que financiou a Beija-Flor, mais de 70% da população vive na pobreza Guiné Equatorial é rica em petróleo, mas indicadores sociais são muito baixos

No país que financiou a Beija-Flor, mais de 70% da população vive na pobreza

Guiné Equatorial é rica em petróleo, mas indicadores sociais são muito baixos
Teodoro Obiang Nguema Mbasogo, presidente-ditador da Guiné Equatorial08.02.15//Themba Hadebe/AP
A Beija-Flor foi campeã do carnaval carioca em 2015 com um desfile quase perfeito, conquistando 269,9 pontos de um máximo de 270 ao cantar a história da Guiné Equatorial. Para chegar ao topo da Sapucaí, a escola de samba de Nilópolis contou com uma ajuda milionária do país africano, uma nação rica em petróleo, governada por uma ditadura há 35 anos, mas que possui indicadores sociais que lembram o Brasil dos anos 1960. Lá, mais de 70% da população vive abaixo da linha da pobreza.
Além dos R$ 5 milhões recebidos da prefeitura do Rio de Janeiro, a Beija-Flor recebeu outros R$ 10 milhões da elite da Guiné Equatorial, segundo reportagem do jornal O Globo.
A própria escola não confirmou nem refutou a informação, mas o embaixador do país no Brasil, Benigno Pedro Matute Tang, que desfilou pela escola na madrugada de terça-feira (17), afirmou queempresários doaram poucas centenas de euros para a agremiação.
Já na festa da vitória, o carnavalesco e presidente da Comissão de Carnaval da Beija-Flor, Fran Sérgio, disse que o patrocínio partiu de empresas que atuam no país africano. Para ele, “quem se incomoda com isso é burro”.
Mas de onde vem o dinheiro da Guiné Equatorial?
Antiga colônia espanhola, a Guiné Equatorial é comandada desde 1979 por Teodoro Obiang Nguema Mbasogo, que chegou ao poder por um golpe militar contra a ditadura de seu tio, Francisco Macías, condenado à morte e executado no mesmo ano.
De lá para cá, a Guiné Equatorial se tornou um importante explorador de petróleo, dando início à exploração na década de 1990 e fazendo do óleo a sua principal fonte de renda.
Ao mesmo tempo, o líder do país se tornou um dos homens mais ricos da África, com fortuna estimada em US$ 600 milhões, segundo dados da revista Forbes para o ano de 2006.
A dependência do petróleo é extrema. Em 2013, o PIB do país chegou a US$ 15,580 bilhões, segundo o Banco Mundial — uma queda de 4,8% em relação ao ano anterior. Desse total de riquezas, 88,5% vêm das exportações.
Além de petróleo, o país exporta também madeira, cuja extração já esteve sob a responsabilidade de Teodoro Nguema Obiang Mangue, ou Teodorín, como é conhecido. Filho do ditador e um dos vice-presidentes do país, ele já foi o ministro da Agricultura e Floresta da Guiné Equatorial. Seu irmão, Gabriel, já ocupou também um cargo no ministério de Minas e Energia.
O dinheiro que entra na Guiné Equatorial vem dos países mais desenvolvidos do mundo. Seus principais parceiros comerciais são o Japão (destino de 18,8% das exportações em 2012, segundo o governo americano), seguido por França (16,1%), China (11,7%), EUA (11,3%) e Holanda (7,2%).
Já a Guiné Equatorial compra sobretudo da Espanha, China, EUA, França e Itália. O Brasil foi o sétimo maior importador do país em 2012, segundo dados da CIA (serviço de inteligência dos EUA).
Pobreza
Apesar da riqueza do país, a população vive em condições pobres. Da população de 722 mil pessoas, 60% vive na zona rural.
A taxa de desemprego é incerta, já que há dados indicando 8% em 2013 (segundo o Banco Mundial) e até 22% (de acordo com a CIA).
No país, a expectativa de vida ao nascer é de 52,6 anos —índice que o Brasil superou durante a década de 1960.
Da mesma forma, a taxa de mortalidade é uma das maiores do mundo: são 96 crianças que morrem antes dos 5 anos a cada mil nascidos — índice muito próximo ao do Afeganistão, e também que relembra o Brasil dos anos 1960.
A porcentagem de pessoas acima de 65 anos é de 3% da população total, índice pior do que países como o Haiti, Botsuana e Zimbábue.
Não há dados confiáveis sobre a quantidade de pessoas abaixo da linha da pobreza. O Banco Mundial, que reúne dados sobre o assunto, não possui números de pessoas que vivem no país com menos de US$ 1,25 por dia.
Mas o arquivo de dados da ONU (Organização das Nações Unidas) contém uma informação para 2006. Naquele ano, 76,8% da população vivia abaixo da linha da pobreza.
Corrupção
Um outro problema grave no país é a corrupção. O país é o 14º do mundo em corrupção, segundo a lista da Transparência Internacional para 2013 (o país não apareceu no ranking de 2014).
Teodorín já enfrentou processos nos Estados Unidos e na França por lavagem de dinheiro e evasão fiscal. Em 2011, a Justiça americana tentou congelar os bens de Teodorín no país — uma casa em Los Angeles avaliada em mais de US$ 30 milhões, um jato particular de US$ 38,5 milhões, uma Ferrari de US$ 500 mil e diversos itens de colecionador do cantor Michael Jackson, avaliados em US$ 2 milhões.
Em outubro passado, um acordo fechado com a Justiça americana o obrigou a vender a mansão em Malibu e a Ferrari, mantendo, no entanto, os outros bens.
Segundo reportagens da BBC na época, para os EUA o motivo do processo seria a origem do dinheiro, supostamente obtido em esquemas de corrupção e pagamento de propina das indústrias petroleiras do país africano.
Seu salário é estimado em US$ 100 mil anuais, outro motivo para a investigação, já que sua fortuna foi estimada em US$ 300 milhões pelos promotores americanos. Mas, com o acordo, Teodorín evitou um processo criminal nos EUA. Assim, ele pode estar na Sapucaí, na terça-feira, para ver o desfile da campeã.